Tenho um amigo, o Side, profissional do ramo agropecuário, que é profundo conhecedor dos aspectos psicológicos dos animais, sobretudo dos ratos. Este psicólogo de ratos orientou-me a não deixar o veneno a disposição dos bichinhos por muito tempo, pois se um rato ver o outro morrendo, não comerá do mesmo alimento que ele…
“Vivendo e aprendendo”… Nunca imaginei que um animal tão irracional quanto o rato fosse tão sentimental assim. Tenho até receio de armar uma ratoeira e deixar alguns filhotinhos órfãos, mas acima de tudo, preciso preservar minha saúde, mesmo que para isso seja preciso uma chacina, pois a presença de um rato na casa, revela uma possibilidade de transmissão de doenças…
De vez em quando, atravesso a noite ao computador, escrevendo… Aliás, quando se faz o que se gosta, o tempo parece não existir… Numa destas noites, percebi, com o canto do olho lá na cozinha o movimento de um ratinho, aparentemente inofensivo… De certa forma, não seria uma má ideia, a companhia de um ratinho para este escritor solitário nesta madrugada fria, afinal Walt Disney começou assim e em homenagem a seu amiguinho, criou o Mikey Mouse… Trabalho com as palavras, portanto, uso de minhas possibilidades para homenagear as criaturas ao meu redor, sejam elas roedoras ou não, portanto nada mais justo que relatar esta situação num texto. Se fosse Walt Disney, ou Maurício de Souza, eu desenharia, se fosse Benedito Rui Barbosa ou Glória Peres, faria uma novela… Mas sou reles cronista, portanto escrevo uma crônica… Porém, trata-se de uma homenagem póstuma, já que o bichinho não viveu para ver este texto pronto…
Incomodado com a situação, fui então até a despensa em busca de uma ratoeira, montei-a com uma migalha de pão e voltei a escrever… De repente, ouvi um estalo e fui conferir o resultado… O miserável do roedor era maior do que parecera anteriormente aos meus olhos astigmáticos e ceratocônicos e a única consequência da ratoeira foi atontá-lo, ou o vivente resolveu, de repente, dançar uma valsa solitária na cozinha da minha residência oficial de inverno…
Na noite seguinte, emprestei uma ratoeira maior e deixei-a amanhecer armada. Pela manhã, a isca já não estava mais lá, no entanto, a armadilha continuava intacta e, provavelmente, meu amigo dentuço continuava vivo… Só pode ter descido de paraquedas…
“Essa não! Tenho de tomar medidas drásticas!” Pensava eu enquanto procurava o veneno comprado dias atrás sob a orientação do psicólogo de ratos. Com os conselhos de meu amigo Side em mente, continuei minha busca por aquele pacotinho azul que daria o tiro de misericórdia… Finalmente encontrei-o furado e vazio, o que me levou a crer que tratava-se de um rato suicida… Por um instante, o arrependimento cruel e dolorido corroeu minha consciência. Fui mentor de um raticídio doloso que não se concretizou, pois a vítima foi mais rápida que eu, preferiu o suicídio a morrer degolado por uma ratoeira miserável e putrefata…
Meu desconsolo foi ainda pior quando encontrei seu corpo inerte no tapete da sala… O desafortunado foi morrer, justamente no lugar mais visível da casa, só para aumentar meu remorso e minha dor… Pobre ratinho! Tão esperto, acabou morrendo pela própria depressão. Ele precisava de ajuda e eu não fiz nada para diminuir seu sofrimento, agora só resta jogá-lo no jardim para servir de alimento para algum gato miserável… Fazer o quê?… Não sou psicólogo de ratos…
Márcio Roberto Goes
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